Olívia é minha cachorinha querida, adotada das ruas de Jandira, estado de São Paulo, há pelo menos uns oito anos, talvez mais, não lembro direito (garanto que amanhã vou procurar os documentos dela pra ver).
Hoje ela mora em Natal, no Rio Grande do Norte. Esta mudança foi um acordo que fiz com minha mãe na segunda visita de férias da Olívia à casa nova dos meus pais: já que eu tinha começado a estudar novamente, ela ficaria, porque não seria justo para um cão ficar “abandonado”, já que eu saía para trabalhar às seis e só voltava da nova faculdade por volta da meia noite.
Foram meus pais que me ensinaram a amar os animais, não tinha como não achar melhor para vida dela esta decisão: uma casa grande que meu pai comprou e para onde se mudaram depois de sua aposentadoria. Pessoas em casa o dia todo dar amor, além de uma cachorrinha para servir de companhia para a Olívia.
Claro, que eu sentia falta, ela também. As visitas a cada ano, ela me esperando no aeroporto e ficando tão feliz ao ponto de ter incontinência urinária! Grudar em mim em todo o tempo que eu estivesse por aqui, sem falar na percepção da minha partida antes mesmo de eu recomeçar a fazer as malas. Juro, dois dias antes ela começava a trazer seus brinquedos para perto da cama que eu dormia e mergulhava numa espécie de depressão.
Mas, mesmo depois que me formei, resolvemos que ela ficaria. Imagina, trocar uma casa com quintal, amigos caninos (a tropa tinha crescido) por uma casa pequena, quase sem quintal e comigo saindo todos os dias para trabalhar? Não, realmente o melhor para a Olívia era continuar em Natal.
A cachorrinha incrível, minha Schnouzer do Paraguai, Olívia Loyola, a emergente que saiu das ruas para andar de avião e morar no Nordeste. A minha alma gêmea em forma de cão: tem alergia de pulgas (de ficar com bolinhas vermelhas na barriguinha), odeia acordar cedo, é extremamente ciumenta com suas coisas materiais (tudo que foi dado para ela, ela defende com latidos e dentes, e ninguém toma de volta) e morde mesmo se alguém se aproximar ameaçando quem ela ama – tudo igual a mim!
Só que a vida nem sempre é um mar de rosas e, como se não bastasse o sofrimento dos seus primeiros anos de vida, quando era uma simples vira latas de rua, cheia de sarna, uma perninha manca (talvez tenha sido atropelada), além de ser xingada de feia (tadinha, todo mundo falava pra eu colocá-la nestes concursos de cães mais feios), agora a bichinha é cega. A catarata tomou conta dos seus dois olhinhos. Eu já sabia que isto aconteceria, mas sei lá… Não acompanhei o processo gradual, da última vez que a vi ela ainda tinha a visão parcial. Fiquei realmente em choque.
Dinheiro para a cirurgia não tenho. Tentar levá-la para São Paulo, submetê-la a uma mudança agora, nestas condições, seria a pior covardia… Aqui é o portinho seguro dela: tem meus pais, que não mudam mais nada de lugar dentro de casa, tem seus companheiros (duas outras cadelinhas e um gato – o caolhinho que minha mãe achou na rua).
E, no meio de tudo isto, acho que ela não sofre tanto. Já está adaptada a sua nova condição. Sabe se virar, tateia devagarinho, anda se guiando pelas paredes, desvia de um pé de cadeira e vai levando… E nunca corre – ato que não mais nos permite mais ver a puxadinha da perninha manca que aparecia só quando ela era rápida, um dos seus charmes.
Brinca com as outras cachorras enquanto elas estão perto, mas, basta as duas outras cadelinhas dispararem na corrida para a Olívia ficar de fora, olhando sem ver, parada no seu canto. Afinal, já disse, ela não corre mais.
Meu coração dói, já perdi as contas das lágrimas derramadas desde a madrugada da segunda passada, quando cheguei aqui, depois de dois anos sem vir.
Revolto-me contra Deus, que permite que mais um animal que eu escolho para criar (a outra foi a Emília) sofra… Por que Senhor? Por que um ser que não peca, que não sabe falar para pedir ajuda, que não faz maldades com o próximo, por que ele sofre? Por que os animais sofrem?
Chego a duvidar que o Deus pai exista… Eu sofro e choro. Mas, você Olívia, eu amo, pra sempre!
PS: Um acalanto na noite foi este post, adorei o nome: Um homem guia para um cão cego. Fica o link.